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Habitação 

Programa Mais Habitação - Participação da Câmara Municipal de Lisboa*

Pronuncia sobre a Proposta de Lei n.º 71/XV/1.ª que pretende estabelecer medidas com o intuito de garantir mais habitação.

Alfama - Lisboa

1 - Introdução e questão preliminar

A pedido da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a Câmara Municipal de Lisboa (CML) foi notificada para se pronunciar sobre a Proposta de Lei n.º 71/XV/1.ª (Proposta de Lei), que pretende estabelecer medidas com o intuito de garantir mais habitação, até 28 de abril de 2023.

Não poderemos deixar de assinalar que o prazo atribuído para a apresentação da pronúncia se afigura excessivamente curto, senão veja-se:

  • A Proposta de Lei deu entrada na Assembleia da República da Proposta de Lei a 14 de abril de 2023
  • A ANMP só deu nota da necessidade de pronúncia pela CML no dia 24 de abril de 2023

É notório que decorreram 10 dias até que a CML tivesse conhecimento da necessidade de apresentação deste parecer, o que revela alguma negligência. Poderiam ter sido invocados motivos ponderosos para que se solicitasse um prazo tão reduzido, mas a CML, até ao momento de submissão do presente documento, não os conhece.

Caberia à ANMP atribuir um prazo para pronúncia de maior dimensão por duas razões: não só a habitação constitui uma das áreas centrais de atuação de qualquer município – e, em particular, do Município de Lisboa –, como também é preciso ter em conta a dimensão e a tecnicidade da Proposta de Lei.

Adicionalmente, com esta Proposta de Lei são criadas penalizações de natureza jurídica e financeira de natureza potencialmente coerciva e, dessa forma, restritivas do princípio da autonomia local para além do que é razoável, o que obrigaria a uma verdadeira auscultação dos municípios pelo Governo.

No entanto, a CML, no tempo considerado necessário para uma análise ponderada, não abdica de emitir o seu parecer relativamente à referida Proposta de Lei porque afeta diretamente as atribuições do Município e competências da respetiva câmara municipal.

2 - Sobre o processo legislativo

Relativamente à Proposta de Lei, a CML já manifestou a sua preocupação com o processo de consulta pública da primeira versão do pacote legislativo intitulado “Mais Habitação”. O Governo não só conduziu o tema de forma “inconstante e sempre sujeita à pressão do momento” como “decidiu – por ação ou omissão – não auscultar preventivamente as autarquias locais”. Se estas conclusões eram verdadeiras à época, agora ganham nova força.

A Proposta de Lei elimina medidas que constavam da versão inicial do pacote “Mais Habitação”, acrescenta medidas novas – a título de exemplo, a nova geração de cooperativismo para a promoção de habitação acessível –, e inclui medidas com elementos mais restritivos – como seja no regime de suspensão de novos registos de alojamento local ou no arrendamento forçado.

Tudo isto é feito sem que, mais uma vez, seja tida em consideração a opinião das autarquias locais. A Proposta de Lei não é acompanhada de qualquer estudo, projeto ou relatório que justifique estas novas opções. Não é conhecido qualquer relatório de ponderação das participações apresentadas durante o período de consulta pública.

Assim, e…

1 - Introdução e questão preliminar

A pedido da Associação Nacional de Municípios Portugueses (ANMP), a Câmara Municipal de Lisboa (CML) foi notificada para se pronunciar sobre a Proposta de Lei n.º 71/XV/1.ª (Proposta de Lei), que pretende estabelecer medidas com o intuito de garantir mais habitação, até 28 de abril de 2023.

Não poderemos deixar de assinalar que o prazo atribuído para a apresentação da pronúncia se afigura excessivamente curto, senão veja-se:

  • A Proposta de Lei deu entrada na Assembleia da República da Proposta de Lei a 14 de abril de 2023
  • A ANMP só deu nota da necessidade de pronúncia pela CML no dia 24 de abril de 2023

É notório que decorreram 10 dias até que a CML tivesse conhecimento da necessidade de apresentação deste parecer, o que revela alguma negligência. Poderiam ter sido invocados motivos ponderosos para que se solicitasse um prazo tão reduzido, mas a CML, até ao momento de submissão do presente documento, não os conhece.

Caberia à ANMP atribuir um prazo para pronúncia de maior dimensão por duas razões: não só a habitação constitui uma das áreas centrais de atuação de qualquer município – e, em particular, do Município de Lisboa –, como também é preciso ter em conta a dimensão e a tecnicidade da Proposta de Lei.

Adicionalmente, com esta Proposta de Lei são criadas penalizações de natureza jurídica e financeira de natureza potencialmente coerciva e, dessa forma, restritivas do princípio da autonomia local para além do que é razoável, o que obrigaria a uma verdadeira auscultação dos municípios pelo Governo.

No entanto, a CML, no tempo considerado necessário para uma análise ponderada, não abdica de emitir o seu parecer relativamente à referida Proposta de Lei porque afeta diretamente as atribuições do Município e competências da respetiva câmara municipal.

2 - Sobre o processo legislativo

Relativamente à Proposta de Lei, a CML já manifestou a sua preocupação com o processo de consulta pública da primeira versão do pacote legislativo intitulado “Mais Habitação”. O Governo não só conduziu o tema de forma “inconstante e sempre sujeita à pressão do momento” como “decidiu – por ação ou omissão – não auscultar preventivamente as autarquias locais”. Se estas conclusões eram verdadeiras à época, agora ganham nova força.

A Proposta de Lei elimina medidas que constavam da versão inicial do pacote “Mais Habitação”, acrescenta medidas novas – a título de exemplo, a nova geração de cooperativismo para a promoção de habitação acessível –, e inclui medidas com elementos mais restritivos – como seja no regime de suspensão de novos registos de alojamento local ou no arrendamento forçado.

Tudo isto é feito sem que, mais uma vez, seja tida em consideração a opinião das autarquias locais. A Proposta de Lei não é acompanhada de qualquer estudo, projeto ou relatório que justifique estas novas opções. Não é conhecido qualquer relatório de ponderação das participações apresentadas durante o período de consulta pública.

Assim, e sem prejuízo da análise ao conteúdo da Proposta de Lei, a primeira conclusão a retirar refere-se ao processo: sendo a habitação um dos temas que convoca diversos intervenientes no domínio da ação pública nacional, regional e local, e que obriga à promoção da confiança na sociedade civil, o Governo optou por avançar unilateralmente, preferindo a incerteza e a divisão.

3 - Considerações sobre a Proposta de Lei

Na pronúncia inicialmente submetida pela CML ao pacote legislativo original, realçou-se a necessidade de definir soluções para o problema da habitação sem “obstinação ideológica e o seu consequente alheamento da realidade”. Assim, orientou-se o parecer em três vetores essenciais: a necessidade de o Estado dar o exemplo, promover a confiança com todos os parceiros e envolver o poder local.

Analisada a Proposta de Lei, é patente que, no essencial, não é alterada a linha programática inicialmente adotada, pelo que ainda se considera necessário recordar e densificar o parecer da CML com base nestes 3 parâmetros.

a) O Estado deve dar o exemplo

Como foi referido na participação da CML original, o Estado encontra-se legalmente vinculado a recorrer prioritariamente ao património edificado público para garantir a função social da habitação. Assim, cabe ao Estado identificar, recuperar e ampliar a oferta habitacional pública antes de recorrer ao mercado habitacional privado. Na Nova Geração de Políticas de Habitação, aprovada pela Resolução de Conselho de Ministros n.º 50-A/2018, de 2 de maio, foi estabelecida uma meta de médio prazo que se tem por essencial: “Aumentar o peso da habitação com apoio público na globalidade do parque habitacional de 2 % para 5 %, o que representa um acréscimo de cerca 170 000 fogos”. Ou seja: o Estado comprometeu-se a aumentar o parque habitacional público em 170 000 fogos.

Em vez de se limitar à identificação prioritária do parque habitacional público disponível e permitir que os municípios se foquem na missão nacional que é a execução do Plano de Recuperação e Resiliência no domínio da habitação, o Governo refugia-se nos municípios para garantir a execução do arrendamento forçado de imóveis devolutos. Se esta medida é já de conteúdo genericamente conhecido, a Proposta de Lei apresenta uma novidade: caso os municípios prescindam de exercer o mecanismo de arrendamento forçado, cessa a aplicação do agravamento da taxa de Imposto Municipal de Imóveis. Para além da evidente perda de receita, trata-se de uma grave violação do princípio da autonomia local e representa uma verdadeira intenção de coação à prossecução de objetivos políticos do Governo que a CML não pode deixar de repudiar.

b) O Estado deve promover a confiança da sociedade civil

Afirmámo-lo na pronúncia original e mantemo-lo: “De forma a responder à crise na oferta de habitação, as respetivas políticas públicas devem promover confiança e estabilidade nos seus destinatários. Ao invés, o Governo opta pela incerteza e disrupção”.

Para além das críticas já apresentadas (a criação de uma situação de desigualdade injustificada com a criação de um novo regime fiscal para o arrendamento e o alojamento local ou o novo regime de arrendamento para subarrendamento), a CML pretende realçar a alteração o regime de suspensão de novos registos para alojamento local. 
Se antes tinha sido estabelecido um termo certo para a suspensão findar – 31 de dezembro de 2030 –, a Proposta de Lei estabelece:

  • A necessidade de definir nas Cartas Municipais de Habitação “o adequado equilíbrio de oferta de habitações e alojamento estudantil no respetivo de território” para pôr termo à suspensão
  • Sendo que a suspensão se mantém “nos municípios que tenham declarado a situação de carência habitacional” (como é o caso de Lisboa, através da deliberação n.º 23/AML/2020, publicada no Boletim Municipal n.º 1355 de 6 de fevereiro de 2020)

Este novo regime de suspensão não mantém a situação de incerteza relativamente ao alojamento local como a aumenta. Não só se procede à eliminação de um prazo certo para terminar o mecanismo de suspensão de novos registos para alojamento local – tornando o transitório em potencialmente permanente –, como se opta por descartar a responsabilidade por esta medida para os municípios. Numa palavra: com esta Proposta de Lei, é transferida injustificadamente a responsabilidade da manutenção da suspensão para os municípios e, dessa forma, contribui para a paralisação das políticas de habitação municipais – nas quais a Carta Municipal de Habitação ganha particular importância – à custa do alojamento local.

Mas a incerteza inicialmente gerada pelo pacote “Mais Habitação” e a consequente ampliação com esta Proposta de Lei não se limita ao alojamento local. Assim, elimina as medidas referentes à Lei de Bases Gerais da Política Pública de Solos, de Ordenamento do Território e de Urbanismo, ao Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial ou ao Regime Jurídico de Urbanização e Edificação e reformula-as num novo pacote legislativo (sem que os municípios sejam consultados sobre um domínio nevrálgico da atuação pública local).

As medidas de simplificação em matéria de controlo prévio de operações urbanísticas e de ordenamento do território – condensadas na Proposta de Lei n.º 77/XV/1.ª e no projeto de decreto-lei anexo à mesma – reiteram a prática seguida em todo este pacote “Mais Habitação”: a par de algumas medidas adequadas e consensuais, são tomadas medidas gravemente lesivas de valores essenciais em matéria de urbanismo e de ordenamento do território e, sobretudo, medidas desligadas da realidade, lesivas da segurança jurídica e, por isso, contraproducentes, sempre na ausência de qualquer estudo ou diagnóstico que minimamente as justificasse.

Num domínio tão sensível como o da habitação, onde a estabilidade da ação pública é essencial para gerar segurança, esta Proposta de Lei vem, pelo contrário, criar mais dúvidas do que certezas, mais desconfiança do que firmeza.

c) O Estado deve envolver os municípios

Esta nova Proposta de Lei não representa qualquer exercício de humildade ou reconhecimento das críticas de que o Governo foi alvo. Pelo contrário, mantém aquele que identificámos como o “pecado original” do pacote legislativo inicialmente apresentado: a “falta de envolvimento das autarquias” reveladora do “centralismo excessivo que pautou a sua elaboração”.

Por isso, mantemos o que inicialmente afirmámos: esta Proposta de Lei confirma o afastamento do Governo dos municípios e o menosprezo pela sua autonomia local. Sendo estes um dos principais destinatários das competências criadas, seria obrigação de quem legisla medir previamente e em conjunto respetivo impacto.

Ainda assim, a cidade de Lisboa continuará a concretizar as suas políticas de habitação, designadamente no âmbito do desígnio nacional que é a execução do PRR.

As medidas seguintes demonstram que se pode apresentar soluções para a área de habitação de forma diferente - aberta, inclusiva e pragmática:

  • 122 milhões de euros destinados à reabilitação de fogos municipais, à construção para aumento do parque habitacional municipal e ao apoio à renda para que qualquer casa possa tornar-se cessível de imediato
  • ajuda, em 2022, a 1259 famílias na atribuição de habitação e no apoio à renda
  • despesa no montante de 19 milhões de euros que já permitiram reabilitar até hoje 427 casas sob gestão da GEBALIS - Gestão do Arrendamento Social em Bairros Municipais de Lisboa (estando previstas mais 400)
  • a realização de uma atribuição histórica de 200 casas em simultâneo para famílias com carências socioeconómicas

* A tomada de posição expressa neste texto representa a avaliação do presidente e de todos os vereadores com pelouro da Câmara Municipal de Lisboa.

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